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quarta-feira, 5 de outubro de 2011

As borboletas voam.

"Não perder a capacidade de se surpreender."

Toda criança se surpreende com as coisas mais tolas da vida. Os adultos, muito espertos, acostumados com o mundo e tudo nele, dizem ao ouvir uma criança por demais entusiasmada com um cavalo, por exemplo: sim sim, é um cavalo, agora fique quieto que as pessoas grandes estão conversando sobre algo de extrema importância.
E a criança aprende que as coisas de extrema importância são as atualidades. É discutir quem tem o melhor emprego, ou o melhor carro. É decidir que carreira seguir no futuro, ou as decisões que ainda serão tomadas. O resto do mundo acaba se tornando desinteressante. Uma borboleta voando é só uma borboleta voando, porque a criança aprendeu que é comum a todas as borboletas voarem e passou a época de se fazer estardalhaço por uma simplicidade dessas.
Mas quando se vê a borboleta pela primeira vez, conhecendo apenas os peixes, é normal assustar-se. "Olha! A borboleta voa!", diria a criança. E provavelmente tudo o que voa viraria uma borboleta.
As pessoas grandes estão se perguntando agora se eu perdi a lucidez. Pedem para que eu vá direto ao ponto, pois incomoda ler algo tão incomum. Eu devia escrever sobre o meu fim de semana, ou sobre um passeio qualquer. Mas estou escrevendo sobre algo muito mais importante: as coisas sem importância.
Como uma criança recém nascida, eu cheguei a um país onde nada é comum para mim. Eu vejo as situações cotidianas e penso: "Olha! A borboleta voa!"
E ninguém pode entender o meu entusiasmo perante a nova borboleta. "É algo comum", pensariam.
E isso me fez pensar. A gente vive num lugar mágico, num planeta maravilhoso. Vemos uma flor bonita e observamos tempo suficiente para saber que ali havia uma flor bonita, mas quem se pergunta de onde ela surgiu? Que milagres devem ter acontecido para que do nada, numa terra triste, brotasse subitamente uma flor?
Eu vejo as pessoas aqui reagindo normalmente a situações milagrosas ou esplendorosas. Viraram adultos. Se preocupam com a ação da bolsa de valores. Se preocupam com a nova música da banda preferida, ou com a impressão que o novo penteado causará. Futilidade, o mundo está cheio dela.
É necessário conservar o assombro de uma criança perante as situações cotidianas. Não aceitar, mas questionar. Alguém me disse que chove e pronto, que eu devo aceitar. Mas por trás da chuva há um mistério indecifrável, por mais que a ciência insista em resolver. Se não sabemos nem mesmo quem somos, é muita presunção achar que sabemos alguma coisa qualquer.
Eu tenho medo que o tempo me agarre algum dia, que alguém diga: "hora de crescer".
Resolvi escrever na mão, no caderno, na memória, só pra não esquecer: "não perder a capacidade de se surpreender."

sexta-feira, 26 de agosto de 2011

Canoagem e motocicletas

     Sábado passado eu fui em um passeio de canoa em Rotenburg com o Rotary, que é o programa de intercâmbio que estou fazendo. O Rotary sempre promove passeios e viagens com os intercambistas e, além desses programas, seus voluntários também fazem muitos trabalhos sociais como, por exemplo, com crianças carentes. O grande objetivo do Rotary com os intercâmbios é promover a paz entre as nações, esse é o grande diferencial. 

     Então eu fui à esse passeio. Foi muito bonito ver todas as paisagens e a natureza. Claro que eu cheguei em casa morta e pensei que ia ter que amputar os braços mais tarde por causa da dor e do cansaço, mas foi bem divertido!

     O destino das canoas era uma casa em Rotenburg onde é o escritório de arquitetura de um dos membros do Rotary. No quintal dessa casa foi onde eu tive o meu primeiro churrasco alemão que, posso afirmar, foi delicioso!

     No dia seguinte, domingo, fui com a Edda (que é membro do Rotary também) a uma competição de motos. Eu adorei porque foi algo bem diferente para mim, e muito interessante também. 

     Era um torneio mundial (apesar de o Brasil não participar) e todos torcemos pela equipe alemã que, é claro, venceu no final! 

     E esse foi o meu fim-de-semana, maravilhoso e cheio de coisas para fazer. Apesar do cansaço, valeu cada segundo!



      

Bremen

     Há alguns dias fui a Bremen, que fica relativamente perto da minha cidade. Andar por Bremen é como encarnar a nostalgia. Todas as enormes construções parecem contar a história de uma era passada, te embalando nessa história como se você fosse algum personagem perdido, que após anos retornou.

     Estar em um lugar tão imenso historicamente, por onde tanta gente passou em tantas décadas diferentes, acaba fazendo com que você se sinta bem pequeno, mas de uma maneira boa. Como se tudo ao seu redor fosse tão grande e  fascinante, que de repente todos os seus problemas sumissem. Você entende que não é tão único e tão só no mundo quanto pensava, uma vez que aquela cidade existia ali antes de você e já abrigou milhares de pessoas que hoje já tiveram suas existências completamente apagadas dessa Terra. 

     Como podemos nos preocupar com coisas tão pequenas durante toda a vida, sabendo que daqui a apenas alguns séculos ninguém saberá nem mesmo nossos nomes? Todas as dores que você passou serão simples fantasmas, que não atormentarão ninguém. 

     Eu senti, enquanto andava por Bremen, a vida de milhares de gerações pulsando nas paredes, nas estradas, nas entranhas da cidade. Eu vi as pessoas que já caminharam por lá antes de nós e que também acreditavam na magnitude de suas ações e na imortalidade do seu ser. Vi as pessoas que choraram e as que sorriram. E vi também aquelas que deixaram naquelas ruas um pouquinho do seu ser.

     E, com um suspiro, me deixei ali também. Acreditando que poderei existir em tudo aquilo que já existiu dentro de mim.

     Acho que nostalgia é o sentimento que nos adentra quando estamos sensíveis e abertos o suficiente para receber um pouco da alma de alguém. Os olhares, quando voltados com profundo sentimento à algum lugar, permanecem incrustados nas paredes, procurando alguém para sentí-los, mesmo que décadas depois.

     As almas nunca se perdem, nunca se vão. Todas as pessoas que passaram por todos os lugares estarão marcadas ali para sempre. Cabe a nós sentí-las.

     E então, que tal um passeio por Bremen?





 

domingo, 14 de agosto de 2011

Waffensen

Waffensen é a pequena vila onde moro na Alemanha. Quando digo pequena, quero dizer que apenas 1000 pessoas moram aqui. Mas é um lugar bastante aconchegante, que nos dá uma imensa vontade de chamar de lar.

Minha família é composta por uma mãe, um pai e três irmãs, mas uma delas também está fazendo intercâmbio, então eu convivo apenas com duas.

O intercâmbio dura um ano, mas a estadia nessa casa é por apenas quatro meses, o que é tão bom quanto ruim. A parte boa é conhecer mais lugares e mais pessoas. Minha segunda família é igualmente maravilhosa e a terceira eu ainda não conheço, infelizmente. A parte ruim é ficar tão pouco tempo com cada uma dessas pessoas, a gente acaba de se acostumar e tem que mudar de casa novamente. Bom, mas tudo tem seu lado bom e seu lado ruim, a questão é saber conviver com os dois em harmonia.

Minha escola fica em Rotenburg, que é um lugar próximo daqui. É muito bonito também, todo preenchido por casinhas lindas. É lá onde fazemos compras de supermercado, vamos à biblioteca, esse tipo de coisa. Seria um bom lugar para morar também.

Ontem à tarde, eu e minhas duas primeiras irmãs passeamos de bicicleta por Waffensen, o que me deu a oportunidade de conhecê-la melhor. Não tem muito o que se ver por aqui, mas eu gosto de observar as pessoas, as casas, as ruas, as árvores.

Em nosso passeio, acabamos passando pelo cemitério da cidade. Para alguns, esse pode ser um assunto estranho para se colocar aqui, mas eu não posso deixar de mencionar quão bonito é o cemitério de Waffensen. Acho que se a gente precisa passar o resto da eternidade em um lugar, ele deve ao menos ser bonito. Me consolaria saber que alguém que eu amo possui seu corpo repousando em um lugar de tanta paz.

Esse fato provavelmente só me chamou tanto a atenção porque foi uma cena imensamente triste conhecer o cemitério da minha cidade natal. Cada pessoa se resumia a um nome e a uma lâmpada que não mais se acendia. Tinha cheiro de esquecimento, de terra e de pranto. O cemitério aqui tem cheiro de paz.

Voltando a um assunto menos fúnebre, o clima em Waffensen tem sido chuvoso, o que eu gosto muito. O céu nublado e o vento frio sempre me agradaram. Da janela do meu quarto, consigo ver as árvores balançando e tenho acesso ao telhado, que fica extremamente convidativo à noite. É algo no mínimo poético, sentar-se no telhado, sentir o vento da noite, observar a lua e então escrever, ou desenhar, ou nada. Tendo o céu e as estrelas não precisamos de mais nada.

Hoje eu percebi a beleza do vôo dos pássaros. Se você observar bem, é como assistir a um musical. Eles cantam em harmonia, voando juntos como em uma dança. Viver em uma cidade como Waffensen é como sempre ver as coisas por um lado mais poético, mais bonito. É por isso que eu simplesmente amo esse lugar!

sexta-feira, 12 de agosto de 2011

Chegando na Alemanha

Hoje já é meu terceiro dia na Alemanha. A chegada foi tranquila, são muitas novidades então você acaba ficando animada e se esquece de outras coisas. Na madrugada da minha primeira noite, eu acordei e comecei a perceber que vou passar um ano aqui. Comecei a sentir uma falta absurda de tudo e de todos, uma falta que eu não entendi na hora. Imagino que seja porque eu estava tão empolgada em vir logo para cá, que nem mesmo me despedi direito dos meus amigos e família. Eu não sentia como se estivesse me despedindo. Um sentimento que me dominou naquela madrugada foi o de algo inacabado. Faltava um adeus.

Eu acho que o fato de ser um ano - não um mês ou uma semana, mas um ano - é o que torna tudo tão assustador. Não que seja realmente assustador, nem que não seja nem um pouco. O fato é que toda decisão que influencie uma parte tão grande de nossa vida é tomada sempre com um pouco de hesitação. E se eu tomar a decisão errada? É difícil não se perguntar isso ao menos uma vez. Mas agora, com a decisão tomada, eu consigo ver claramente. Não, eu não tomei a decisão errada. Por mais difícil que seja e que ainda possa ser, foi o certo a ser feito. Não é todo mundo que tem a oportunidade que eu estou tendo nesse momento e seria muito estúpido da minha parte desperdiçá-la com esse tipo de pergunta.

Eu ainda não entendo a língua, mas já começo a me acostumar com tudo por aqui. De alguma forma, eu sempre senti como se estivesse indo para casa e é onde eu estou, em casa. Todas essas pessoas, elas não me são estranhas. Elas são como memórias de uma época que eu ainda viverei. Parece estranho, mas é como eu me sinto. Acho que tudo já estava interligado desde sempre. Há alguém lá em cima planejando e cuidando disso tudo.

Então aqui está a resposta para uma pergunta que possa surgir. Fazer ou não fazer intercâmbio? Eu não sei como alguém pode permitir que o medo o impeça de realizar uma experiência tão maravilhosa. A resposta é sempre sim! Você não pode dizer não pra vida, que ela diz não pra você. Cada oportunidade é única. Aproveite! Aprenda! A gente só pára de aprender quando pára de viver. O medo, ele dura um momento, mas a experiência é para toda a vida.

sábado, 25 de junho de 2011

Para as pessoas da minha vida

"O que tem de ser, tem muita força. Ninguém precisa se assustar com a distância, os afastamentos que acontecem. Tudo volta! E voltam mais bonitas, mais maduras, voltam quando tem de voltar, voltam quando é pra ser. Acontece que entre o ainda-não-é-hora e nossa-hora-chegou, muita gente se perde. Não se perca, viu?"
                        
                - Caio Fernando Abreu

     Tudo na vida tem um momento e um propósito. Há pessoas que entram na nossa vida por pequenos períodos, cumprem a sua missão e inevitavelmente nos deixam, às vezes mais cedo do que poderíamos esperar ou querer.
     Há pessoas que entram por acaso e deixam marcas permanentes.
     Há pessoas que conhecemos e no momento não nos marcam, porque não estava na hora, então há o reencontro e as coisas mudam de um jeito que nunca sonhamos.
     Há pessoas que percebemos a importância apenas no momento do adeus e nos arrependemos por não termos sabido aproveitar o tempo, enquanto este ainda existia.
     E finalmente, há pessoas que deixam uma sementinha no seu coração antes de partir. E durante todo o tempo fora, a semente vai se transformando em uma linda flor. E você não compreende por que a cada dia a saudade aumenta e a amizade floresce. Até que vocês se encontram novamente e você entende porque as coisas são como são. Às vezes são tristes para serem bonitas. Ou curtas para serem mais longas.
     Mas não existe uma fórmula; a gente vai errar, a gente vai perder, a gente vai desperdiçar o tempo e depois faremos tudo de novo. Porque a vida é feita de instantes. Alguns instantes duram para sempre, outros você não pode evitar que comecem a esvair pelos seus dedos.
     Mas é preciso amar muito, porque o amor nunca é um desperdício.
     Eu sei que o tempo que passarei fora será o suficiente para me afastar irreversivelmente de algumas pessoas. Mas também será o tempo suficiente para cultivar algumas flores que deixaram no meu coração. O que tiver que ser, será. Tenho certeza.
     Que a gente continue se conhecendo, se esquecendo, se reencontrando, se cultivando.
     E seja lá o que aconteça, que a gente nunca se esqueça.
     O que é pra sempre pode durar muito pouco, mas nunca acaba.

Introdução

“Meus braços são por demais pequenos para o mundo que eu quero abraçar.”

     Fazer intercâmbio não é uma ideia antiga para mim. Na verdade eu realmente nunca havia me imaginado deixando essa cidade algum dia. Eu acho que algumas pessoas são bastante fechadas em seus mundinhos e eu era assim. É tudo muito aconchegante em casa, até muito fácil. Qualquer problema que você tenha, os seus pais estarão ali, ao seu lado.
     Então por que afinal deixar o conforto de casa para seguir uma jornada em um país distante, com uma cultura completamente diferente e uma língua quase alienígena? Acho que tudo começou quando recebemos uma intercambista aqui em casa. Tudo o que ela me disse sobre suas experiências aqui, sobre como estava mudada e o que estava sentindo, foi como enxergar o meu futuro. De alguma forma eu percebi que o nosso mundo não pode ser tão pequeno. Existe tanta coisa lá fora, por que não procurar conhecer? Também existe o fato de que eu não poderei viver pra sempre com os meus pais e preciso saber me virar sem eles.
     Então eu diria que a ideia do intercâmbio veio primeiramente de uma necessidade. Necessidade de me descobrir e de descobrir o mundo ao meu redor. Porque por incrível que pareça, existe um mundo lá fora. E, apesar de tudo, ele é bastante bonito.
     Eu não sei exatamente tudo o que mudou em mim, mas nesse momento eu não consigo enxergar o meu futuro sem esse intercâmbio nele.
     Acho que o que todas as pessoas esperam do seu ano é voltar diferentes. Alguns esperam voltar mais independentes; outros mais amadurecidos; outros entendendo melhor as pessoas e suas diferentes culturas; outros esperam voltar com muitos novos conhecimentos e outros vão apenas pelo prazer da viagem. No meu caso, eu espero tudo isso e mais um pouco.
   
     Mas por que Alemanha? Bom, acho que uma série de fatores compõe a nossa vida, uma série de circunstâncias. E muitas circunstâncias se interligaram para que o meu destino fosse a Alemanha nesse momento. Eu acredito que exista um propósito grande por trás disso, que eu ainda não consigo enxergar. E sei que uma porta está definitivamente sendo aberta no meu futuro, cabe a mim saber aproveitar a oportunidade.